domingo, 8 de março de 2009

NO DIA 8 DE MARÇO, DISPENSE A ROSA!




Dia 8 de março seria um dia como qualquer outro, não fosse pela rosa e os parabéns. Toda mulher sabe como é. Ao chegar ao trabalho e dar bom dia aos colegas, algum deles vai soltar: ”parabéns”.

Por alguns segundos, a gente tenta entender por que raios estamos recebendo parabéns se não é nosso aniversário (exceção, claro, à minoria que, de fato, faz aniversário neste dia). Depois de ficar com cara de bestas, num estalo a gente se lembra da data, dá um sorriso amarelo e responde “obrigada”, pensando: “mas por que eu deveria receber parabéns por ser mulher?”.

Mais tarde, chega um funcionário distribuindo rosas. Novamente, sorriso amarelo e obrigada. É assim todos os anos. Quando não é no trabalho, é em alguma loja. Quando não é numa loja, é no supermercado. Todos os anos, todo 8 de março: é sempre a maldita rosa.

Dizem que a rosa simboliza a “feminilidade”, a delicadeza. É a mesma metáfora que usam para coibir nossa sexualidade — da supervalorização da virgindidade é que saiu o verbo “deflorar” (como se o homem, ao romper o hímen de uma mulher, arrancasse a flor do solo, tomando-a para si e condenando-a – afinal, depois de arrancada da terra, a flor está fadada à morte). É da metáfora da flor, portanto, que vem a idéia de que mulheres sexualmente ativas são “putas”, inferiores, menos respeitáveis.

A delicadeza da flor também é sua fraqueza. Qualquer movimento mais brusco lhe arranca as pétalas. Dizem o mesmo de nós: que somos o “sexo frágil” e que, por isso, devemos ser protegidas. Mas protegidas do quê? De quem? A julgar pelo número de estupros, precisamos de proteção contra os homens. Ah, mas os homens que estupram são psicopatas, dizem. São loucos. Não é com estes homens que nós namoramos e casamos, não é a eles que confiamos a tarefa de nos proteger. Mas, bem, segundo pesquisa Ibope/Instituto Patricia Galvão, 51% dos brasileiros dizem conhecer alguma mulher que é agredida por seu parceiro. No resto do mundo, em 40 a 70 por cento dos assassinatos de mulheres, o autor é o próprio marido ou companheiro.Este tipo de crime também aparece com frequência na mídia. No entanto, são tratados como crimes “passionais” – o que dá a errônea impressão de que homens e mulheres os cometem com a mesma frequência, já que a paixão é algo que acomete ambos os sexos. Tratam os homens autores destes crimes como “românticos” exagerados, príncipes encantados que foram longe demais. No entanto, são as mulheres as neuróticas nos filmes e novelas. São elas que “amam demais”, não os homens.

Mas a rosa também tem espinhos, o que a torna ainda mais simbólica dos mitos que o patriarcado atribuiu às mulheres. Somos ardilosas, traiçoeiras, manipuladoras, castradoras. Nós é que fomos nos meter com a serpente e tiramos o pobre Adão do paraíso (como se Eva lhe tivesse enfiado a maçã goela abaixo, como se ele não a tivesse comido de livre e espontânea vontade). Várias culturas têm a lenda da vagina dentata. Em Hollywood, as mulheres usam a “sedução” para prejudicar os homens e conseguir o que querem. Nos intervalos do canal Sony, os machos são de “respeito” e as mulheres têm “mentes perigosas”. A mensagem subliminar é: “cuidado, meninos, as mulheres são o capeta disfarçado”. E, foi com medo do capeta que a sociedade, ao longo dos séculos, prendeu as mulheres dentro de casa. Como se isso não fosse suficiente, limitaram seus movimentos com espartilhos, sapatos minúsculos (na China), saltos altos. Impediram-na que estudasse, que trabalhasse, que tivesse vida própria. Ela era uma propriedade do pai, depois do marido. Tinha sempre de estar sob a tutela de alguém, senão sua “mente perigosa” causaria coisas terríveis.

Mas dizem que a rosa serve para mostrar que, hoje, nos valorizam. Hoje, sim. Vivemos num mundo “pós-feminista” afinal. Todas essas discriminações acabaram! As mulheres votam e trabalham! Não há mais nada para conquistar! Será mesmo? Nos últimos anos, as diferenças salariais entre homens e mulheres (que seguem as mesmas profissões) têm crescido no Brasil, em vez de diminuir. Nos centros urbanos, onde a estrutura ocupacional é mais complexa, a disparidade tende a ser pior. Considerando que recebo menos para desempenhar o mesmo serviço, não parece irônico que o meu colega de trabalho me dê os parabéns por ser mulher?

Dizem que a rosa é um sinal de reconhecimento das nossas capacidades. Mas, no ranking de igualdade política do Fórum Econômico Mundial de 2008, o Brasil está em 10oº lugar entre 130 países. As mulheres têm 11% dos cargos ministeriais e 9% dos assentos no Congresso — onde, das 513 cadeiras, apenas 46 são ocupadas por elas. Do total de prefeitos eleitos no ano passado, apenas 9,08% são mulheres. E nós somos 52% da população.

A rosa também simboliza beleza. Ah, o sexo belo. Mas é só passar em frente a uma banca de revistas para descobrir que é exatamente o contrário. Você nunca está bonita o suficiente, bobinha. Não pode ser feliz enquanto não emagrecer. Não pode envelhecer. Não pode ter celulite (embora até bebês tenham furinhos na bunda). Você só terá valor quando for igual a uma modelo de 18 anos (as modelos têm 17 ou 18 anos até quando a propaganda é de creme rejuvenescedor…). Mas mesmo ela não é perfeita: tem de ser photoshopada. Sua pele é alterada a ponto de parecer de plástico: ela não tem espinhas nem estrias nem olheiras nem cicatrizes nem hematomas, nenhuma dessas coisas que a gente tem quando vive. Ela sorri, mas não tem linhas ao lado da boca. Faz cara de brava, mas sua testa não se franze. É magérrima (às vezes, anoréxica), mas não tem nenhum osso saltando. É a beleza impossível, mas você deve persegui-la mesmo assim, se quiser ser “feminina”. Porque, sim, feminilidade é isso: é “se cuidar”. Você não pode relaxar. Não pode se abandonar (em inglês, a expressão usada é exatamente esta: “let yourself go”). Usar uma porrada de cosméticos e fazer plásticas é a maneira (a única maneira, segundo os publicitários) de mostrar a si mesma e aos outros que você se ama. “Você se ama? Então corrija-se”. Por mais contraditória que pareça, é esta a mensagem.

Todo dia 8 de março, nos dão uma rosa como sinal de respeito. No entanto, a misoginia está em toda parte. Os anúncios e ensaios de moda glamurizam a violência contra a mulher. Nas propagandas de cerveja e programas humorísticos, as mulheres são bundas ambulantes, meros objetos sexuais. A pornografia mainstream (feita pela Hollywood pornô, uma indústira multibilionária) tem cada vez mais cenas de violência, estupro e simulação de atos sexuais feitos contra a vontade da mulher. Nos videogames, ganha pontos quem atropelar prostitutas.

Todo dia 8 de março, volto para casa e vejo um monte de mulheres com rosas vermelhas na mão, no metrô. É um sinal de cavalheirismo, dizem. Mas, no mesmo metrô, muitas mulheres são encoxadas todos os dias. Tanto que o Rio criou um vagão exclusivo para as mulheres, para que elas fujam de quem as assedia. Pois é, eles não punem os responsáveis. Acham difícil. Preferem isolar as vítimas. Enquanto não combatermos a idéia de que as mulheres que andam sozinhas por aí são “convidativas”, propriedade pública, isso nunca vai deixar de existir. Enquanto acharem que cantar uma mulher na rua é elogio , isso nunca vai deixar de existir. Atualmente, a propaganda da NET mostra um pinguim (?) dizendo “ê lá em casa” para uma enfermeira. Em outro comercial, o russo garoto-propaganda puxa três mulheres para perto de si, para que os telespectadores entendam que o “combo” da NET engloba três serviços. Aparentemente, temos de rir disso. Aparentemente, isso ajuda a vender TV por assinatura. Muito provavelmente, os publicitários criadores desta peça não sabem o que é andar pela rua sem ser interrompida por um completo desconhecido ameaçando “chupá-la todinha”.

Então, dá licença, mas eu dispenso esta rosa. Não preciso dela. Não a aceito. Não me sinto elogiada com ela. Não quero rosas. Eu quero igualdade de salários, mais representação política, mais respeito, menos violência e menos amarras. Eu quero, de fato, ser igual na sociedade. Eu quero, de fato, caminhar em direção a um mundo em que o feminismo não seja mais necessário.

…Enquanto isso não acontecer, meu querido, enfia esta rosa no dignissímo senhor seu cu.


Autoria: Marjorie Rodrigues / Organização: Comunidade Feminismo e Libertação / Saiba mais sobre a campanha.

Dia Internacional da Mulher???

Gostaria de inaugurar o blog escrevendo um pouco sobre o Dia Internacional da Mulher.
Eu estaria muito feliz pela data ter caído no domingo este ano, se eu não trabalhasse no domingo é claro. Explico: trabalhar no Dia Internacional da mulher sendo uma significa aturar uma enorme carga de cavalheirismo machista, ouvir um parabéns, ganhar uma rosa murcha ou um chocolate comprado na promoção... talvez seja pior ouvir os anúncios e ver as promoções de cosméticos por aí ou ouvir as infames piadinhas.

Esta não é uma data para nos paparicar e nos tratar como bonecas, nem mesmo de nos oferecer algum tipo de vantagem, NÃO!!!
Esta, é uma data de luto, de protesto. Como posso dar um sorriso amarelo diante daquele parabéns de uma sociedade completamente misógina? Sinceramente? Não me desce uma coisa dessas.

Talvez aceite este cumprimento no dia em que receberemos de acordo com a nossa competência e não com o nosso sexo; no dia em que uma parcela bem considerável dos homens descobrir o quão ridículo é ficar abordando mulheres anônimas com cantadas nas ruas; que quando fizermos algo muito bem não se diga que o fazemos "que nem homem", nem que somos "muito macho"; que não sejamos anuladas nem no passado, nem no presente; que nossos erros sejam vistos como humanos e não como uma "tentativa de se nivelar ao homem por baixo"; que nossa vida sexual, seja ela como for, não diga respeito a ninguém que não a nós mesmas e que nenhuma de nós ouça insultos por fazer o que quiser de seu corpo; que nosso corpo nos pertencer integralmente e que as pessoas se sintam envergonhadas em estereotipar e impor padrões inalcansáveis; que sejamos vistas além do útero; que estupro seja crime hediondo contra a pessoa e não contra o costume; que nenhuma de nós tenha que se submeter ao estupro remunerado que é prostituição para conseguir sobreviver; que todas as pessoas encarem a pornografia (das dançarinas semi-nuas dos programas de domingo, passando pelas revistas ditas masculinas até os filmes pornô) como algo danoso para todos; que mulheres e homens possam se vestir, maquiar e cortar o cabelo como desejarem sem que isso implique em questionamentos sobre sexualidade; que todas as sexualidades sejam igualmente respeitadas; que dizer coisas como "Estupra mas não mata", "Lésbicas merecem ser estupradas para aprender a gostar de homem", "Se foi estuprada é por que provocou o estuprador" ,e suas variantes, seja motivo de indignação, revolta e protesto por parte da sociedade; que femicídio seja um crime punido duramente e que não se coloque os criminosos passionais como pobres apaixonados sofrendo de amor; que a violência doméstica seja inaceitável; que se insulte a pessoa quando se estiver com raiva dela e não sua mãe, esposa, irmã, prima, etc; que parem de nos ver como um objeto estuprável; que uma mulher possa andar sozinha sem medo ou preocupação; que uma mulher jamais seja considerada uma assassina por exercer sua liberdade e seu direito a seu corpo e que nunca seja considerada um monstro por não querer procriar ou se recusar a parir; por fim mas não menos importante que seja um absurdo inconcebível uma instituição religiosa condenar uma menininha por exercer seu direito legal e não fazer o mesmo com a criatura abominável que a violentou durante 3 anos.

Neste dia aceitarei de bom grado os parabéns, até lá terei que ficar com os pêsames e pensar que aquelas corajosas guerreiras morreram em vão.

Cortando a faixa...

Eu sou a Lyrio, e este é o D'Lyrio, um blog com alguns textos e reflexões. Eu sou péssima de apresentações então entrem, sentem, peguem uma bebida e fiquem a vontade ok?